quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Desenvolvendo a imitação - Por Claudia Zirbes

Texto maravilhoso retirado da página do face Autismo e Possibilidades


DESENVOLVENDO A IMITAÇÃO

Por Claudia Zirbes
Baseada no que aprendi no Modelo Denver de Intervenção Precoce (ESDM), pretendo escrever três textos a respeito da intervenção para promover o Desenvolvimento da Linguagem: 1) Desenvolvendo a Imitação, 2) Desenvolvendo a Comunicação Não verbal e 3) Desenvolvendo a Comunicação verbal. Este é o primeiro.
É natural ouvir entre os pais de crianças com TEA (eu me incluía neste grupo): “Eu só quero que meu filho fale”. E levou algum tempo para eu compreender que meu filho não despertaria de uma hora para a outra e começaria a falar sem antes construir alguns pilares da Linguagem. O primeiro pilar é a imitação e nas pessoas neurotípicas esta habilidade não requer nenhuma intenção consciente. Nossas habilidades de imitação permitem uma fácil transferência de sentimentos, habilidades e até pensamentos para outra pessoa. A imitação é uma base para o aprendizado. Nossos cérebros são “puxados” para a imitação de um modo especial, através de células do cérebro chamadas de neurônios espelho que ligam ações que vemos os outros fazerem com nosso próprio padrão, apenas por assistir. A Imitação acontece em muitas áreas. Através da imitação facial, a criança reproduz outras expressões, o que aparece facilmente em harmonia com o emocional. Através da imitação vocal, a criança explora e adquire novos sons. Através da imitação gestual, a criança compreende o poder da comunicação para se expressar e compreender os outros. Sendo assim, ao contrário do que muitos pensam, a imitação não ocorre apenas envolvendo ações com objetos. Nas interações com crianças pequenas e seus pais eles usam a imitação para manter a brincadeira interessante.
Crianças pequenas com TEA não são muito imitativas. São muito menos inclinadas a imitar gestos, palavras, ações de outros do que as outras crianças típicas da mesma idade. Esta perda na imitação pode reduzir drasticamente as oportunidades de aprendizado, e se isso continuar, se torna uma enorme barreira para aprender com professores, pais, terapeutas e outras crianças. Ainda não se sabe exatamente por que a imitação é um problema tão grande no autismo, mas nós sabemos que crianças pequenas com autismo são capazes de aprender a imitar uma vasta quantidade de comportamentos em vários domínios. Sou fã de ABA (meu filho atualmente ainda segue um programa intenso), mas acredito ter sido essencial para seu desenvolvimento a abordagem do ESDM que se apóia em muitas evidências a respeito da efetividade do ensino naturalístico da imitação.
Na proposta do ESDM, que segue premissas de ABA (Applied Behavior Analysis) e do PRT (Pivotal Response Training), recomenda-se a seguinte sequência para ensinar a Imitação: 1) Imitar ações com objetos 2) Imitação de movimentos do corpo, sem objetos, na qual nos referimos como imitação gestual; 3) Imitação oral facial; e 4) imitação vocal de sons e palavras. Mas afinal: COMO ENSINAR IMITAÇÃO PARA NOSSAS CRIANÇAS? O caminho básico do ensino envolve capturar a atenção da criança com atividades motivadoras, modelando a ação, e então dando comandos para a criança imitar antes de continuar a atividade compensadora.

1.IMITAÇÃO EM OBJETOS: Para uma criança não imitativa, geralmente a imitação progride mais rápido com a imitação em objetos de causa e efeito, pois elas podem experimentar o efeito da ação no objeto e é mais fácil dar este tipo de comando. Quando se começa a trabalhar numa imitação com objeto, use ações que já estão no repertório da criança. Por exemplo, se a criança bate com um martelo, você pega a sua vez (dizendo:“minha vez” “bam, bam”) e imita ela batendo o martelo(“dizendo bang, bang” e devolve o martelo para ela. Se a criança bater de novo com o martelo, responda positivamente,”isso, bam, bam!” Deixe a criança batendo, sem pegá-lo de volta em seguida. Se a criança não bater o martelo, então rapidamente de um comando físico da ação e adicione os efeitos de som e deixe-a ter o martelo em seguida. A criança está verdadeiramente imitando? Não necessariamente. Ela pode estar continuando um comportamento próprio, mas experimentando a sincronia de duas pessoas fazendo a mesma coisa. E é assim que a imitação começa. Você deveria ficar neste nível de habilidade até a criança imitar consistentemente você, depois de você ter imitado ela primeiro, para várias ações diferentes (de 8-10 ações), e então passar para o próximo nível de dificuldade. Agora você modela a ação primeiro, antes de dar o objeto para a criança. Dentro da proposta do ESDM é importante a criança ter um interesse genuíno no objeto em questão. Então, a exemplo do martelo, dizemos algo como “”você bate”, se a criança imitar, ela brinca com o martelo por um tempo. Se não, você pega o martelo, demonstra novamente, dá o comando ( e a ajuda física) para ter certeza que a imitação ocorre e então deixa a criança ter o martelo. Continue neste nível até a criança ter 8-10 ações no seu repertorio de imitação iniciadas por você. Isto representa o domínio completo do nível 1 de imitação do currículo ESDM. 
O próximo nível, de imitação são com objetos novos. Isto envolve uma ação não usual, mas simples, como espetar uma bandeirinha ou outro brinquedo numa bolinha de massinha de modelar, bater com um pauzinho em uma lata...enfim simples, mas novo, diferente do seu repertório e acima de tudo, interessante. Materiais que funcionam muito bem em atividades novas de imitação são: massinha de modelar, materiais de arte, conjunto de carrinhos e caminhões, e brinquedos de “mentirinha”-panelinhas, comidinhas, bonecos. Matérias que não funcionam bem para imitação de objetos são aqueles que a criança tem um repertório restrito e repetitivo de manejo. Uma vez que a criança está indo bem na imitação, você pode incorporar aqueles que tem uso repetitivo e ir moldando as ações introduzindo atividades mais flexíveis de brincar com estes. Entretanto, lembre-se, ensinando a imitar pela primeira vez, o aprendizado ocorrerá mais facilmente se você escolher objetos e ações que a criança lida com flexibilidade.

2.IMITAÇÃO GESTUAL: No ESDM ensina-se a imitação gestual ou imitação de movimentos do corpo durante uma atividade com significado para a criança. As duas situações nas quais gestos são amplamente ensinados, são durante rotinas “sensório-sociais” como: cantigas de roda e brincadeiras divertidas que podem envolver motricidade ampla e comunicação gestual convencional (como:sim e não, com a cabeça, apontar, “meu” entre outros). Ao passo que o repertório da criança se desenvolve, usando e compreendendo este, gestos descritos podem ser ensinados para a criança durante o brincar, para dizer aos outros para agir de um determinado modo com aquele objeto/brinquedo. Gestos descritivos típicos são: Põe dentro, tira para fora, coloca, vira, espera, põe aqui, alto, baixo, comprido, grande e pequeno (pense nos gestos para isso!) É interessante dispor de uma terceira pessoa junto dando ajuda física por trás da criança enquanto o outro modela a ação. 
ATENÇÃO: Imitação oral-facial: Estas são um tanto difíceis para crianças pequenas com autismo aprenderem. Entretanto descobriu-se que isto é muito importante para desenvolver a imitação vocal das crianças que não fazem isto espontaneamente. Em tais crianças a imitação oral-facial deve ser cuidadosamente desenvolvida. Sabe-se que é bem mais fácil de obter sucesso na imitação facial depois que a criança imita independentemente e consistentemente 8-10 ações com o corpo. Parta de ações simples e motivadoras como: Exagerando nos sopros para bolinhas de sabão, nas cantigas, fazendo caras engraçadas e barulho de animais durante uma contação de estória, brincadeiras no espelho e outros. Se a criança imita isto, deve ser sempre reforçado.
Depois que a criança consegue imitar novos gestos de face, cabeça,e corpo, eles já tem os pré-requisitos para aprender gestos convencionais através da imitação. Para ensiná-los, combine o gesto a ser ensinado com o comportameto comunicativo que a criança já possui para expressar aquela função pragmática. (Se a criança ainda não desenvolveu gestos naturais básicos para expressar protesto, pedido, interesse e interação social, estes devem ser ensinados antes- (próximo texto será sobre comunicação não verbal) Por exemplo, organize um esquema que a criança irá recusar, como empurrar uma comida que não gosta. Uma vez que a criança produz esta comunicação, segure o reforçador, modele o gesto desejado (exagerando!), e dê um comando para a criança imitá-lo. Reforce imediatamente. Agora você emparelhou o gesto já existente na criança com o convencional e o reforço foi dado após o gesto convencional. Neste caso a intenção comunicativa é o estímulo (antecedente-recusa de comida e o reforço a própria retirada da comida). Não tente fazer isto em TODAS as oportunidades, isto não seria natural.

3.IMITAÇÃO VOCAL: A imitação vocal é provavelmente a habilidade mais importante que nós podemos ensinar a uma criança não verbal. Mas para a criança que não imita sons, é uma das habilidades mais difíceis de ensinar. A imitação vocal é necessária para aprender a falar. Para a criança relativamente silenciosa, a imitação vocal é construída através de um longo caminho. Na maioria das vezes o melhor jeito de estimular as vocalizações são através de brincadeiras divertidas que estimulem qualquer tipo de vocalização. Brincadeiras envolvendo “suspense”. Quando a criança vocalizar, imite ela imediatamente e providencie a ação reforçadora. Para crianças relativamente silenciosas, reforce a vocalização mais fortemente do que qualquer outra habilidade, dando seu brinquedo ou atividade mais preferida.
Imitem crianças quando elas estão agindo em objetos e vocalizando simultaneamente. Quando nós os imitamos, capturamos sua atenção e criamos uma oportunidade para um jogo de imitação. Elas parecem ficar mais atentas a outra pessoa e mais inclinadas a imitar, quando também são imitadas. Uma vez que este jogo se torna familiar, o adulto pode ter este esquema como uma base e a criança começará a imitar mais e mais comportamentos e sons. Ao passo que as vocalizações vão aumentando, e você esta consistentemente imitando ela, você começará a observar a alternância de vez, ou seja, a criança vocaliza, você vocaliza em resposta, e em seguida ela vocaliza, então você vocaliza em resposta novamente.... Isto é um passo muito importante e obviamente deve ser reforçado com uma atividade ou objeto desejado. Uma vez que isto esta acontecendo consistentemente, esta na hora do próximo passo: Imitação de sons no repertório vocal da criança.
* Iniciando Vocalizações bem Estabilizadas: Até então a criança está apta para alternar vezes em vocalizações. Agora o terapeuta começa a alternância das vocalizações usando sons do repertório da criança (sons que o terapeuta e a criança já produziram previamente) para ver se ela imitará o som ou não. Para iniciar esta atividade use o mesmo tipo de brincadeira física que deram suporte a estes sons previamente. Posicione a criança para a atividade, capture o olhar dela, produza a vocalização e olhe com expectativa para ela. Se a criança não o fizer, tente novamente, com um pouco de ação “acompanhadora”. Se ainda assim não for possível, continue seu trabalho na alternância de imitações vocais espontâneas. Eventualmente ela iniciará esta imitação durante a alternância.
* Aumente vocalizações Diferenciadas: Ao passo que a criança começa a imitar a fala, nós precisamos tanto de vocalizações frequentes quanto de variações destas. Tanto vogais quanto consoantes devem ser anotadas nos objetivos da criança e na coleta de dados de cada sessão. Escute e anote (grave se for possível) o som das vogais e das consoantes que você escutou em cada sessão. Para novos sons que vão chegando ao repertório da criança, reforce com uma atividade ou brinquedo preferido. Também tente incluir estes novos sons que ela está produzindo na narrativa das suas brincadeiras.
* Quando a criança não está Produzindo Fonemas: Se a criança não está produzindo fonemas (sílabas contendo a combinação consoante e vogal) você terá que construir isto. È possível ajudá-la a produzir estes sons , combinando a imitação de alguns sons com a imitação oral motora. Em todos estes casos, trabalhe junto com um fonoaudiólogo, que escolherá os melhores sons para começar. (Se a criança precisa intensiva ajuda para produzir fonemas, ela poderá se beneficiar de uma técnica de fonoaudiologia chamada PROMPT (Hayden, 2004), que objetiva o problema de dispraxia, mas infelizmente pouquíssimo conhecida no Brasil. Incorpore as recomendações deste profissional para desenvolver fonemas no seu tratamento. 
* Use Sons e Contextos com Significado: A proposta de construir a imitação vocal é desenvolver a fala com significado. Esta imitação deve ser focada a uma palavra ou som dentro de uma atividade, por exemplo se o contexto for uma atividade envolvendo carrinhos o som deve estar relacionado a isto. Relembre de reforçar todos os sons com um objeto desejado, ou atividade que a criança goste.
* Não Enfatize a Pronuncia Distinta: Lembre-se como os bebês começam a falar. Não foque na articulação mais madura e reforce as vocalizações próximas do que se quer. Isto melhora com o tempo. Aprender mais sons e palavras é uma forma primária de melhorar a pronúncia.
* Não Enfatize Imitações de Expressões com Multi-palavras para Iniciantes na Fala!!! Siga aquela regra de acrescentar uma palavra a mais nas expressões da criança de cada vez (se ela fala com você usando uma palavra, fale com ela usando no máximo duas). Mesmo que a criança tenha uma excelente imitação verbal e isso seja tentador...não faça isso! Nós percebemos que usar a imitação para aumentar as sentenças das crianças com TEA reforça a ecolalia e impede a criança de aprender o poder da comunicação.
* Repita mas use o bom senso: Ações motoras requerem repetição para estabilizar e aumentar as conexões neurológicas que promovem estas. Tanto na imitação gestual quanto vocal, tente algumas vezes rapidamente. Entretanto, se a tarefa está muito difícil para a criança, não peça que isto seja repetido imediatamente. Troque para uma atividade fácil. Não se preocupe se a criança precisar de alguns comandos depois de já ter feito aquela imitação independentemente uma vez. Tenha certeza de que está mantendo ela bem motivada com objetos e atividades altamente preferidas. Se a criança está desanimada, não tente conseguir uma imitação. Troque seu foco por construir novamente a motivação. Tente prevenir o acontecimento dos fracassos, adicione um comando ou um alvo mais fácil rapidamente. A IMITAÇÃO É UMA HABILIDADE TÃO IMPORTANTE, QUE NÓS PRECISAMOS TER CERTEZA DISTO NÃO TORNA-SE UMA ATIVIDADE DESAGRADÁVEL OU MUITO DIFÍCIL PARA A CRIANÇA.
Por Claudia Zirbes
Referências: Rogers, S.; Dawson, G., EARLY START DENVER MODEL FOR YOUNG CHILDREN WITH AUTIST, The Guilford Press, 2010
Ingersoll, B. & Schreibman, L., THE SOCIAL ROLE OF IMITATION IN AUTISM, 2006

Nenhum comentário:

Postar um comentário