terça-feira, 8 de julho de 2014

Alfabetizando Crianças Autistas - por Vera Juhlin

Por Vera Juhlin - Por Revista Autismo
Convidada a escrever sobre minhas experiências como Pedagoga Especial trabalhando com crianças com autismo na Suécia desde 1991, senti-me muito honrada em participar desta Revista.
Por ter sido professora de classes de primeira série, alfabetizando crianças numa escola no Estado de São Paulo, depois coordenadora pedagógica de educação artística, diretora de escola, supervisora de escola, professora de metodologia e prática de Ensino na UNIVAP de São José dos Campos, SP, procurei usar todo o meu conhecimento e experiência para trabalhar com crianças com necessidades especiais e com crianças com autismo.
Somente a minha experiência e graduação anteriores não foram suficientes, tive que adquirir conhecimentos específicos adequados ao trabalho com essas crianças. Meu primeiro curso foi sobre o método TEACCH para poder estruturar o trabalho na sala de aula e os materiais instrucionais, criando dessa forma um ambiente compreensível, estimulador e de ensino em pequenos passos, assim como de melhoria da comunicação.
Em seguida fiz, na Suécia, o curso sobre o PEP-R (Perfil Psico Educacional Revisado) e mais tarde o PEP-3 (sua terceira edição validada) para avaliação dos meus alunos e obtenção dos seus pontos fortes, dos pontos fracos e dos comportamentos emergentes, ou seja, das habilidades que deveriam ser estimuladas e que deveriam constar do plano individual da criança. A partir dos resultados do PEP-3 pode-se fazer o plano individual para o desenvolvimento de cada aluno, partindo do seu nível atual de desenvolvimento.
Para desenvolver a capacidade de comunicação dos alunos, utilizei três técnicas que se completaram: o Relation Play (Comunicação, Auto-Confiança e Alegria dos Movimentos) o PECS (Sistema de Comunicacão por Troca de Figuras) e Histórias Sociais (técnica para aumentar a competência social do aluno, através do desenho). Utilizei muita música, desenho, dramatização, e a técnica de rabiscação, em que os alunos desenvolvem a psicomotricidade necessária para a escrita. Para estimular a integração sensorial das crianças utilizei o Relation Play e a Estimulação Tátil (Terapia do Toque).
Dediquei-me a ensinar essas crianças a ler e a escrever, usando as ideias de Emília Ferreiro e Ana Teberosky, eu mesma havendo feito uma pesquisa na Suécia sobre ” O Desenvolvimento da Leitura e da Escrita de Crianças com Necessidades Especiais” que foi publicada em forma de um livro no Brasil. Ficou demonstrado nessa pesquisa, que as crianças com necessidades especiais obtêm o desenvolvimento da leitura e da escrita da mesma forma que outras crianças ditas ”normais”, quando estimuladas adequadamente.
Existe um modo de estimular a leitura e a escrita que permite que essas crianças aprendam de modo natural, criando suas concepções e reproduzindo o sistema de escrita exatamente como é esperado, quando se conhece a trajetória desse desenvolvimento natural.
Podemos ter uma lista de verificação desse desenvolvimento, e segui-lo passo a passo através dos textos produzidos espontaneamente pelos alunos.
Tudo isso foi observado e registrado no livro por mim publicado, com estudos de casos com diferentes crianças, e o seu desenvolvimento maravilhoso.
Qual é o caminho natural do desenvolvimento da leitura e da escrita ?
QUANTO Á LEITURA
Em primeiro lugar a criança precisa ver o adulto que lê e escreve. Isso requer que os pais leiam um livro de história para o seu filho, todos os dias, até ele saber tal história de cor .
Mostrar as figuras do livro, passar o dedo da criança sob as palavras, e pedir para que ela aponte onde estão as figuras e onde estão as letras.
Podemos levar a criança a ” ler” placas, rótulos de alimentos que a criança ingere, nomes de brinquedos, e o nome dela, dos coleguinhas e das pessoas da família. Essa pseudo leitura deve ser sempre de coisas ou objetos que sejam do mundo da criança e deve ser de modo funcional, isto é, quando ela ingere os alimentos, quando ela vê uma placa ou marca de carro, quando escrevemos carta ou bilhetes, e assim por diante.
Podemos escrever em uma folha de papel bem grande a letra da música que a criança mais gosta e cantar todos juntos com ela, passando o dedo no texto e colando figuras nas palavras mais interessantes para a criança.
Emília Ferreiro chama isto de ”mergulhar na leitura e escrita”,
A criança vai perceber que o que se fala, se escreve e o que se escreve, se lê.
QUANTO Á ESCRITA
Deixar a criança rabiscar, dar a ela muito papel, canetas hidrográficas e giz de cor. Se ela não rabiscar, pegue a mão da criança e rabisque com ela (ajuda do ‘eu’). A rabiscação é a preparação para a escrita; a criança vê as letras ao seu redor, em tudo o que é impresso e começa a imitar essas letras, cria letras parecidas com as verdadeiras, mas podem aparecer muitos rabiscos.
Deve-se deixar a criança brincar de escrever ( ela faz rabiscos); pedir-lhe para ler o que escreveu.
Ela pode desenhar e depois ”escrever” em baixo do desenho (isso é maravilhoso).
Começar a ensinar as primeiras letras dos nomes dos alunos e da equipe escrevendo-os em tiras de papel para fazer inúmeros joguinhos (pedagógicos).
Tudo deve ser divertido, agrável, ativo, em situacões de vida e não de ”escola” tradicional, cheia de
carteiras, regras e situações rígidas. Crianças especiais aprendem quando estão interessadas, quando acham a atividade divertida, e o aprendizado ocorre de acordo com o seu nível de desenvolvimento.
Todos os meus alunos com autismo, com fala ou sem fala, com retardo mental ou não, aprenderam a ler e a escrever. O que foi diferente é que fizeram no tempo que necessitaram.

Vera Juhlin é mestre em Tecnologia Educacional pelo INPE, S.J.Campos e em Pedagogia Especial pela Escola de Professores Especiais de Estocolmo. Escreveu o livro "O desenvolvimento da Leitura e da Escrita das Crianças com Necessidades Especiais" (interessados escrevam para pandorga.formacao@terra.com.br). Skype: verabrogan; e-mail: vera.juhlin@brogan.se

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